A reforma trabalhista entrou em vigor há um ano e os desempregados não têm nada a comemorar. Além de não aumentar o número de vagas, a nova legislação diminuiu o salário médio dos trabalhadores, que ficaram ainda mais fragilizados, e trouxe apenas vantagens aos empregadores.
A reforma trabalhista completa um ano neste dia 11 de novembro, mas os trabalhadores não têm muito o que comemorar. Afinal, os empregados tiveram sua remuneração média reduzida, pois as poucas vagas que estão sendo geradas são, de modo geral, informais, precárias e com baixos salários, segundo o Centro de Estudos Sindicais e de Economia do Trabalho da Unicamp (Cesit).
Nos meses de janeiro e maio, o salário médio dos trabalhadores admitidos foi inferior ao dos demitidos. Essas características dos empregos pós-reforma estão relacionadas às formas de contratação criadas ou alteradas pela nova lei, como o contrato intermitente e a jornada parcial, além do problema da rotatividade. Entre abril e setembro, 29.986 pessoas foram contratadas para o trabalho intermitente e, destas, 8.801 foram dispensadas. “Esta forma de contratação não traz absolutamente nenhuma segurança, não tem proteção alguma e também tem dispensa. Corresponde a 5% do saldo de empregos gerados neste período”, informa a pesquisadora do Cesit Marilane Teixeira.
O professor de Direito Trabalhista da PUC-SP e FGV, Paulo Sergio João, concorda com a pesquisadora. Ele diz que o contrato de trabalho intermitente não serviu para incluir na formalidade os trabalhadores que prestavam serviços de maneira informal. E vai além, ao mencionar que a nova legislação não ajudou também na criação de empregos ou novos postos de trabalho, pois, sem desenvolvimento econômico e geração de riqueza, nenhum decreto servirá de modelo milagroso para incluir no trabalho formal 13 milhões de desempregados.
O presidente da CUT-SP, Douglas Izzo, lembra que depois da reforma foram criadas pouco mais de 370 mil novas vagas e de qualidade duvidosa, sem os direitos fundamentais dos trabalhadores. Além disso, houve um enfraquecimento da relação capital e trabalho, fortalecendo ainda mais os empresários nas negociações com os trabalhadores, por conta da preferência do negociado sobre o legislado. “As homologações que agora podem ser feitas nas empresas trazem prejuízos ao empregado, porque não contam com a fiscalização do sindicato”, diz.
As avaliações sobre a reforma são tão desencontradas que mesmo a redução, pela metade, do número de novas ações trabalhistas é criticada e comemorada. O resultado está relacionado a uma mudança nas normas para o trabalhador que tem direito à Justiça gratuita. Com a nova lei, esse empregado passa a pagar os honorários do perito e do advogado da parte contrária referentes à parte do processo que ele perder.
Para o presidente da Anamatra (Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho), Guilherme Feliciano, os trabalhadores estão com medo de entrar na Justiça. Ele afirma que nunca é possível ter certeza da vitória numa causa trabalhista e, ao arriscar, o trabalhador pode sair devendo em vez de receber aquilo que acredita ter direito. Por outro lado, a mudança na lei não tem impacto sobre o descumprimento da legislação por parte dos empresários.
O professor de Direito Trabalhista da FGV, Thiago de Carvalho, no entanto, faz um balanço positivo da reforma pelo aumento da qualidade dos pedidos nas ações trabalhistas. Para ele, o principal aspecto da nova legislação, que merece um rápido posicionamento do Supremo Tribunal Federal (STF), é a possível limitação de acesso ao Poder Judiciário pela mudança na forma de concessão da Justiça gratuita. “Essa futura decisão do Supremo será um divisor de águas nas relações de trabalho no Brasil, junto à terceirização e contribuição sindical”, argumenta. Para o professor, de qualquer forma, a reforma trouxe avanços ao afetar diretamente as relações sindicais e as de trabalho com empregados de altos cargos.
Clemente Ganz Lúcio, diretor técnico do Dieese (Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos), diz que a reforma tem em sua essência o fortalecimento dos empresários em detrimento dos trabalhadores. No entanto, ele pondera que a consolidação da nova lei pode levar alguns anos, afetando os empregados gradativamente.
Para Ganz Lúcio, os maiores prejuízos que já começaram a aparecer são os riscos de erros ou fraudes no momento da homologação, no qual o trabalhador, sem a assistência do sindicato, pode ter uma perda econômica e a precarização das condições de trabalho, principalmente no chamado contrato intermitente. “No entanto, é importante registrar que existem muitas empresas que não têm interesse em fazer uma precarização das relações do trabalho. Elas sabem que manter uma boa relação, pagar bons salários e serem corretas com o trabalhador também traz vantagens em termo de produtividade e de crescimento. Não necessariamente todas as empresas querem fazer uso deste instrumento de precarização”, afirma.
As principais mudanças
FÉRIAS – Podem ser divididas em até três períodos, sendo que um deles não pode ser inferior a 15 dias.
JORNADA – Poderá ser de 12 horas x 36 horas, respeitando o limite de 44 horas semanais, ou 48 horas com as horas extras, e 220 horas mensais.
TEMPO NA EMPRESA – Não são consideradas dentro da jornada de trabalho atividades como descanso, estudo, alimentação, interação com colegas, higiene pessoal e troca de uniforme.
DESCANSO – O intervalo poderá ser negociado, desde que tenha pelo menos 30 minutos de parada.
REMUNERAÇÃO – O pagamento do piso ou salário mínimo não será obrigatório na contratação por produção.
TRANSPORTE – O tempo gasto até o local de trabalho e a volta, por qualquer meio de transporte, não é computado na jornada de trabalho.
TRABALHO INTERMITENTE – O trabalhador pode ser pago por período trabalhado, recebendo pelas horas ou diária, com direito a férias, FGTS, Previdência e 13º salário proporcionais. No contrato, deverá estar estabelecido o valor da hora de trabalho, que não pode ser inferior ao valor do salário mínimo por hora ou à remuneração dos demais empregados que exercem a mesma função.
HOME-OFFICE – Tudo o que o trabalhador usar em casa será formalizado com o patrão via contrato, como equipamentos e gastos com energia e internet, e o controle do trabalho será feito por tarefa.
TRABALHO PARCIAL – Duração de até 30 horas semanais, sem horas extras, ou 26 horas semanais ou menos, com até 6 horas extras, com acréscimo de 50%.
NEGOCIAÇÃO – Convenções e acordos coletivos podem prevalecer sobre a legislação. Assim, os sindicatos e as empresas podem negociar condições de trabalho diferentes das previstas em lei, mas não necessariamente num patamar melhor para os trabalhadores.
DEMISSÃO – O contrato de trabalho poderá ser extinto de comum acordo, com pagamento de metade do aviso prévio e metade da multa de 40% sobre o saldo do FGTS. O empregado poderá ainda movimentar até 80% do valor depositado pela empresa na conta do FGTS, mas não terá direito ao seguro-desemprego.
TERCEIRIZAÇÃO – Está autorizada inclusive para atividades-fim. Existe a quarentena de 18 meses que impede que a empresa demita o trabalhador efetivo para recontratá-lo como terceirizado, que tem as mesmas condições de trabalho dos efetivos, como atendimento em ambulatório, alimentação, segurança, transporte, capacitação e qualidade de equipamentos.
GRAVIDEZ – É permitido o trabalho de mulheres grávidas em ambientes considerados insalubres, desde que a empresa apresente atestado médico que garanta que não há risco ao bebê nem à mãe.
RESCISÃO CONTRATUAL – A homologação da rescisão do contrato de trabalho pode ser feita na empresa, na presença dos advogados do empregador e do funcionário.
AÇÕES NA JUSTIÇA – O trabalhador será obrigado a comparecer às audiências na Justiça do Trabalho e, caso perca a ação, arcar com as custas do processo. Para os chamados honorários de sucumbência, devidos aos advogados da parte vencedora, quem perder a causa terá de pagar entre 5% e 15% do valor da sentença.
CONTRIBUIÇÃO SINDICAL – A contribuição sindical é opcional.